A Goiânia esquecida
Redação DM
Publicado em 8 de julho de 2022 às 20:33 | Atualizado há 6 meses“O símbolo de uma geração inteira segue abandonado”

A afirmação é da arquiteta Marília Mota Rezende, em relação ao Jóquei Clube. Ela é mestre em Arquitetura e Urbanismo pela UFG. Suas pesquisas tiveram enfoque na ética aplicada na preservação do Patrimônio Histórico e Cultural e no Patrimônio da Praça Cívica em Goiânia. Em entrevista ao DM, fala sobre o abandono de outras edificações importantes, a exemplo do prédio do Museu Zoroastro Artiaga.
DM – Quais são as construções e monumentos de Goiânia que percebe estar em situação de abandono atualmente e que foram ou são símbolos da cidade?
Marília Rezende – O Jóquei Clube é um grande exemplo. As disputas sobre o futuro de uma das obras do arquiteto Paulo Mendes da Rocha em Goiânia permanecem. O símbolo de uma geração inteira da cidade não vê andamento no seu processo de tombamento e segue abandonado. Mesmo dentre as edificações tombadas, a situação atual do prédio do Museu Zoroastro Artiaga e do que abrigava originalmente o Tribunal de contas (e que foi sede da Procuradoria Geral do Estado até recentemente, mudança realizada pelas questões estruturais), ambos na Praça Cívica, são preocupantes. As infiltrações, os problemas estruturais e o abandono são questões visíveis – e colocam em risco, inclusive, o acervo do Museu. Existem promessas de intervenção em ambos: mas elas já virão com muito atraso. Mas destaco um local que foi de extrema importância nos anos iniciais da cidade e está quase esquecido, pela população e pelo poder público: A antiga Estação Rodoviária de Goiânia. Localizada próximo ao Lago das Rosas de projeto de Eurico Calixto de Godoy em 1956. Hoje a edificação está ocupada por um batalhão do corpo de Bombeiros, parcialmente descaracterizada com grandes anexos e escondida por muros. O local – de arquitetura moderna e marcante – era o portal de chegada dos muitos imigrantes antes de 1986. Hoje foi engolido pela cidade. Já houve um projeto de restauro aos padrões originais e adaptação de uma alameda gastronômica – mas é só mais um que não saiu do papel.
DM – Quais locais que por algum momento foram esquecidos, mas que foram retomados?
MR – O Coreto, a Estação Rodoviária e o Pórtico do IFG (Antiga Escola Técnica) são exemplos de edificações ou monumentos tombados que ficaram muitos anos abandonados, ou em péssimas condições de manutenção e passaram recentemente (nos últimos cinco anos) por processos de restauro que renovaram sua presença de destaque na cidade. Um respiro contra o esquecimento.
DM- Goiânia é uma cidade que preserva bem suas construções mais antigas?
MR– Não consigo responder que sim. Mal conseguimos preservar aquelas que possuem toda uma legislação protetiva de tombamentos nas três instâncias, como os já citados na Praça Cívica. No âmbito comercial: projetos como o “Cara Limpa” de 2001 não conseguiram viabilidade política para execução, possuindo apenas intervenções pontuais realizadas, e auxiliar na restauração da região central de Goiânia. No âmbito residencial: Um levantamento de 2017, comandado pela Prof. Dra. Eline Caixeta fez um inventário de 339 residências históricas nos setores Central, Sul, Oeste, Aeroporto, Marista, Bueno e Universitário, e mesmo antes da finalização do estudo grande parte dessas construções já estavam descaracterizadas ou foram completamente demolidas, e é grande a probabilidade de nesses cinco anos de lá pra cá, o único registro de que mais da metade dessas construções existiram seja nesse trabalho realizado. Os setores Sul e Jaó tem se destacado na luta por legislações que protejam o setores da verticalização que já atingiu outras áreas da cidade, e que pode passar a ser permitida no novo Plano Diretor com aprovação pendente, verticalização que traz consigo uma quantidade incontável de demolições: como as ainda realizadas semanalmente no Setor Marista.

Muito sobre a Goiânia que não existe mais pode ser encontrado em uma página que vem ganhando força no Instagram. Trata-se do perfil Goiás Tem História (@goiastemhistoria), que já computa mais de 20 mil de seguidores.
A página é gerida pelo jornalista Iuri Godinho, um pesquisador entusiasta do assunto e, já escreveu livros sobre a capital, como “A Construção – Cimento, Ciúme e Caos nos Primeiros Anos de Goiânia, em 2013.
Em seu perfil é possível conhecer e ver fotos sobre a época em que o Chafariz na Praça Universitária havia um importante bar e restaurante, a Avenida Goiás (entre a Rua 3 e a Praça do Bandeirante) era o local mais valorizado da capital e as pessoas iam lá para namorar.
“Quem lembra de quando Mauricinho Hippie andava pelas ruas assoviando com um cachorrinho cor de rosa?”, recorda.
A página, o jornalista conta que nasceu do seu interesse latente pela história. No entanto, quando questionado sobre o que mais sente saudades nos tempos idos, Iuri diz achar a Goiânia de hoje muito melhor. “Melhoramos no trânsito, hoje tem muito mais ônibus e asfalto. Não tinha muito o que fazer, tinha mais bares. Hoje temos muito mais opções culturais e de laser”, diz.
“O símbolo de uma geração inteira segue abandonado”

A afirmação é da arquiteta Marília Mota Rezende, em relação ao Jóquei Clube. Ela é mestre em Arquitetura e Urbanismo pela UFG. Suas pesquisas tiveram enfoque na ética aplicada na preservação do Patrimônio Histórico e Cultural e no Patrimônio da Praça Cívica em Goiânia. Em entrevista ao DM, fala sobre o abandono de outras edificações importantes, a exemplo do prédio do Museu Zoroastro Artiaga.
DM – Quais são as construções e monumentos de Goiânia que percebe estar em situação de abandono atualmente e que foram ou são símbolos da cidade?
Marília Rezende – O Jóquei Clube é um grande exemplo. As disputas sobre o futuro de uma das obras do arquiteto Paulo Mendes da Rocha em Goiânia permanecem. O símbolo de uma geração inteira da cidade não vê andamento no seu processo de tombamento e segue abandonado. Mesmo dentre as edificações tombadas, a situação atual do prédio do Museu Zoroastro Artiaga e do que abrigava originalmente o Tribunal de contas (e que foi sede da Procuradoria Geral do Estado até recentemente, mudança realizada pelas questões estruturais), ambos na Praça Cívica, são preocupantes. As infiltrações, os problemas estruturais e o abandono são questões visíveis – e colocam em risco, inclusive, o acervo do Museu. Existem promessas de intervenção em ambos: mas elas já virão com muito atraso. Mas destaco um local que foi de extrema importância nos anos iniciais da cidade e está quase esquecido, pela população e pelo poder público: A antiga Estação Rodoviária de Goiânia. Localizada próximo ao Lago das Rosas de projeto de Eurico Calixto de Godoy em 1956. Hoje a edificação está ocupada por um batalhão do corpo de Bombeiros, parcialmente descaracterizada com grandes anexos e escondida por muros. O local – de arquitetura moderna e marcante – era o portal de chegada dos muitos imigrantes antes de 1986. Hoje foi engolido pela cidade. Já houve um projeto de restauro aos padrões originais e adaptação de uma alameda gastronômica – mas é só mais um que não saiu do papel.
DM – Quais locais que por algum momento foram esquecidos, mas que foram retomados?
MR – O Coreto, a Estação Rodoviária e o Pórtico do IFG (Antiga Escola Técnica) são exemplos de edificações ou monumentos tombados que ficaram muitos anos abandonados, ou em péssimas condições de manutenção e passaram recentemente (nos últimos cinco anos) por processos de restauro que renovaram sua presença de destaque na cidade. Um respiro contra o esquecimento.
DM- Goiânia é uma cidade que preserva bem suas construções mais antigas?
MR– Não consigo responder que sim. Mal conseguimos preservar aquelas que possuem toda uma legislação protetiva de tombamentos nas três instâncias, como os já citados na Praça Cívica. No âmbito comercial: projetos como o “Cara Limpa” de 2001 não conseguiram viabilidade política para execução, possuindo apenas intervenções pontuais realizadas, e auxiliar na restauração da região central de Goiânia. No âmbito residencial: Um levantamento de 2017, comandado pela Prof. Dra. Eline Caixeta fez um inventário de 339 residências históricas nos setores Central, Sul, Oeste, Aeroporto, Marista, Bueno e Universitário, e mesmo antes da finalização do estudo grande parte dessas construções já estavam descaracterizadas ou foram completamente demolidas, e é grande a probabilidade de nesses cinco anos de lá pra cá, o único registro de que mais da metade dessas construções existiram seja nesse trabalho realizado. Os setores Sul e Jaó tem se destacado na luta por legislações que protejam o setores da verticalização que já atingiu outras áreas da cidade, e que pode passar a ser permitida no novo Plano Diretor com aprovação pendente, verticalização que traz consigo uma quantidade incontável de demolições: como as ainda realizadas semanalmente no Setor Marista.

Tomar banho no Lago das Rosas na década de 40, jogar bola no Jóquei Clube de Goiás nos anos 70, frequentar o Café Cancun no estacionamento do Flamboyant e no caminho se deparar com a Praça do Relógio, nos anos de 1990. Tudo isto está bem vivo, mas apenas no mundo das lembranças e das fotos. No auge de seus 88 anos, Goiânia possui muita história para contar, além de locais, hábitos, construções que o tempo levou. Que tal recordar alguns ícones da goianidade de décadas passadas, que por diversos motivos não existem mais?
Lembranças em que Goiânia era um local mais pacífico e o Centro um reduto cultural, são, por exemplo, algumas das saudades que o escritor e presidente da Associação Goiana de Letras (AGL), Ubirajara Galli carrega consigo. Natural de Pires do Rio, chegou na cidade em 1972, para fazer o curso científico, o atual segundo grau.
Por aqui andava por todo lado a pé. “Eu morava no Setor Bueno e tinha uma namorada que morava no Setor Marista e era tranquilo andar de forma despreocupada pelas ruas a noite. Voltava da casa dela a pé, sem problemas, o que hoje pode ser complicado”, compara.
Para sair, a Praça Tamandaré era um dos points da juventude e o estilo era a MPB. “Lá havia locais como Zero Bar e Cirus, que eram espaços gastronômicos os percussores do som ao vivo nos bares. Foram ainda os primeiros palcos de nomes como Carlos Brandão, Gilberto Correa, Valter Mustafé”, ressalta o escritor.
Ainda de acordo com Ubirajara Galli, o Centro vivia seu auge. Entre a Rua 8 e a Avenida Tocantins haviam os cinemas Cine Ouro, Capri e Casa Branca. “O Teatro Goiânia era nosso principal palco de espetáculos teatrais e musicais. Lá tive a oportunidade de ver de perto nomes como Toquinho e Vinícius”, recorda.
A Feira Hippie, nas décadas de 80 e 90, o escritor conta que era um espaço mais voltado aos artesãos e às artes plásticas e era realizada na Praça Cívica. E, durante a feira, havia a chamada Barraca dos Escritores, livraria e uma das primeiras editoras da capital, que publicou obras de nomes como Bernardos Elis e o primeiro livro de Ubirajara Galli, em 1977. “Lá era ainda um ponto de encontro dos escritores, que apareciam para tomar um café, uma cachaça, conversar”, diz.
Abandono
Ubirajara cita também outro símbolo de Goiânia cujas estruturas não são mais usadas e está em estado de abandono, o Jóquei Clube de Goiás. O espaço trata-se do primeiro clube de Goiânia e foi inaugurado em 1938. Já contou com a presença de nomes como o presidente do Brasil da época, Getúlio Vagas, e chegou a ter mais de 22 mil metros quadrados.
O espaço, que começou a entrar em decadência na década de 1990, viveu seu auge na década de 1970, principalmente por ter dado ênfase no esporte. Possuía até times profissionais. Mas em 2010 foi fechado com dividas milionárias e envolvido em batalhas judiciais. “Era um clube que tinha ainda toda uma efervescência cultural, com exposição, lançamento de livros e também promovia o melhor carnaval de Goiânia.
Enciclopédia goiana

Muito sobre a Goiânia que não existe mais pode ser encontrado em uma página que vem ganhando força no Instagram. Trata-se do perfil Goiás Tem História (@goiastemhistoria), que já computa mais de 20 mil de seguidores.
A página é gerida pelo jornalista Iuri Godinho, um pesquisador entusiasta do assunto e, já escreveu livros sobre a capital, como “A Construção – Cimento, Ciúme e Caos nos Primeiros Anos de Goiânia, em 2013.
Em seu perfil é possível conhecer e ver fotos sobre a época em que o Chafariz na Praça Universitária havia um importante bar e restaurante, a Avenida Goiás (entre a Rua 3 e a Praça do Bandeirante) era o local mais valorizado da capital e as pessoas iam lá para namorar.
“Quem lembra de quando Mauricinho Hippie andava pelas ruas assoviando com um cachorrinho cor de rosa?”, recorda.
A página, o jornalista conta que nasceu do seu interesse latente pela história. No entanto, quando questionado sobre o que mais sente saudades nos tempos idos, Iuri diz achar a Goiânia de hoje muito melhor. “Melhoramos no trânsito, hoje tem muito mais ônibus e asfalto. Não tinha muito o que fazer, tinha mais bares. Hoje temos muito mais opções culturais e de laser”, diz.
“O símbolo de uma geração inteira segue abandonado”

A afirmação é da arquiteta Marília Mota Rezende, em relação ao Jóquei Clube. Ela é mestre em Arquitetura e Urbanismo pela UFG. Suas pesquisas tiveram enfoque na ética aplicada na preservação do Patrimônio Histórico e Cultural e no Patrimônio da Praça Cívica em Goiânia. Em entrevista ao DM, fala sobre o abandono de outras edificações importantes, a exemplo do prédio do Museu Zoroastro Artiaga.
DM – Quais são as construções e monumentos de Goiânia que percebe estar em situação de abandono atualmente e que foram ou são símbolos da cidade?
Marília Rezende – O Jóquei Clube é um grande exemplo. As disputas sobre o futuro de uma das obras do arquiteto Paulo Mendes da Rocha em Goiânia permanecem. O símbolo de uma geração inteira da cidade não vê andamento no seu processo de tombamento e segue abandonado. Mesmo dentre as edificações tombadas, a situação atual do prédio do Museu Zoroastro Artiaga e do que abrigava originalmente o Tribunal de contas (e que foi sede da Procuradoria Geral do Estado até recentemente, mudança realizada pelas questões estruturais), ambos na Praça Cívica, são preocupantes. As infiltrações, os problemas estruturais e o abandono são questões visíveis – e colocam em risco, inclusive, o acervo do Museu. Existem promessas de intervenção em ambos: mas elas já virão com muito atraso. Mas destaco um local que foi de extrema importância nos anos iniciais da cidade e está quase esquecido, pela população e pelo poder público: A antiga Estação Rodoviária de Goiânia. Localizada próximo ao Lago das Rosas de projeto de Eurico Calixto de Godoy em 1956. Hoje a edificação está ocupada por um batalhão do corpo de Bombeiros, parcialmente descaracterizada com grandes anexos e escondida por muros. O local – de arquitetura moderna e marcante – era o portal de chegada dos muitos imigrantes antes de 1986. Hoje foi engolido pela cidade. Já houve um projeto de restauro aos padrões originais e adaptação de uma alameda gastronômica – mas é só mais um que não saiu do papel.
DM – Quais locais que por algum momento foram esquecidos, mas que foram retomados?
MR – O Coreto, a Estação Rodoviária e o Pórtico do IFG (Antiga Escola Técnica) são exemplos de edificações ou monumentos tombados que ficaram muitos anos abandonados, ou em péssimas condições de manutenção e passaram recentemente (nos últimos cinco anos) por processos de restauro que renovaram sua presença de destaque na cidade. Um respiro contra o esquecimento.
DM- Goiânia é uma cidade que preserva bem suas construções mais antigas?
MR– Não consigo responder que sim. Mal conseguimos preservar aquelas que possuem toda uma legislação protetiva de tombamentos nas três instâncias, como os já citados na Praça Cívica. No âmbito comercial: projetos como o “Cara Limpa” de 2001 não conseguiram viabilidade política para execução, possuindo apenas intervenções pontuais realizadas, e auxiliar na restauração da região central de Goiânia. No âmbito residencial: Um levantamento de 2017, comandado pela Prof. Dra. Eline Caixeta fez um inventário de 339 residências históricas nos setores Central, Sul, Oeste, Aeroporto, Marista, Bueno e Universitário, e mesmo antes da finalização do estudo grande parte dessas construções já estavam descaracterizadas ou foram completamente demolidas, e é grande a probabilidade de nesses cinco anos de lá pra cá, o único registro de que mais da metade dessas construções existiram seja nesse trabalho realizado. Os setores Sul e Jaó tem se destacado na luta por legislações que protejam o setores da verticalização que já atingiu outras áreas da cidade, e que pode passar a ser permitida no novo Plano Diretor com aprovação pendente, verticalização que traz consigo uma quantidade incontável de demolições: como as ainda realizadas semanalmente no Setor Marista.

Tomar banho no Lago das Rosas na década de 40, jogar bola no Jóquei Clube de Goiás nos anos 70, frequentar o Café Cancun no estacionamento do Flamboyant e no caminho se deparar com a Praça do Relógio, nos anos de 1990. Tudo isto está bem vivo, mas apenas no mundo das lembranças e das fotos. No auge de seus 88 anos, Goiânia possui muita história para contar, além de locais, hábitos, construções que o tempo levou. Que tal recordar alguns ícones da goianidade de décadas passadas, que por diversos motivos não existem mais?
Lembranças em que Goiânia era um local mais pacífico e o Centro um reduto cultural, são, por exemplo, algumas das saudades que o escritor e presidente da Associação Goiana de Letras (AGL), Ubirajara Galli carrega consigo. Natural de Pires do Rio, chegou na cidade em 1972, para fazer o curso científico, o atual segundo grau.
Por aqui andava por todo lado a pé. “Eu morava no Setor Bueno e tinha uma namorada que morava no Setor Marista e era tranquilo andar de forma despreocupada pelas ruas a noite. Voltava da casa dela a pé, sem problemas, o que hoje pode ser complicado”, compara.
Para sair, a Praça Tamandaré era um dos points da juventude e o estilo era a MPB. “Lá havia locais como Zero Bar e Cirus, que eram espaços gastronômicos os percussores do som ao vivo nos bares. Foram ainda os primeiros palcos de nomes como Carlos Brandão, Gilberto Correa, Valter Mustafé”, ressalta o escritor.
Ainda de acordo com Ubirajara Galli, o Centro vivia seu auge. Entre a Rua 8 e a Avenida Tocantins haviam os cinemas Cine Ouro, Capri e Casa Branca. “O Teatro Goiânia era nosso principal palco de espetáculos teatrais e musicais. Lá tive a oportunidade de ver de perto nomes como Toquinho e Vinícius”, recorda.
A Feira Hippie, nas décadas de 80 e 90, o escritor conta que era um espaço mais voltado aos artesãos e às artes plásticas e era realizada na Praça Cívica. E, durante a feira, havia a chamada Barraca dos Escritores, livraria e uma das primeiras editoras da capital, que publicou obras de nomes como Bernardos Elis e o primeiro livro de Ubirajara Galli, em 1977. “Lá era ainda um ponto de encontro dos escritores, que apareciam para tomar um café, uma cachaça, conversar”, diz.
Abandono
Ubirajara cita também outro símbolo de Goiânia cujas estruturas não são mais usadas e está em estado de abandono, o Jóquei Clube de Goiás. O espaço trata-se do primeiro clube de Goiânia e foi inaugurado em 1938. Já contou com a presença de nomes como o presidente do Brasil da época, Getúlio Vagas, e chegou a ter mais de 22 mil metros quadrados.
O espaço, que começou a entrar em decadência na década de 1990, viveu seu auge na década de 1970, principalmente por ter dado ênfase no esporte. Possuía até times profissionais. Mas em 2010 foi fechado com dividas milionárias e envolvido em batalhas judiciais. “Era um clube que tinha ainda toda uma efervescência cultural, com exposição, lançamento de livros e também promovia o melhor carnaval de Goiânia.
Enciclopédia goiana

Muito sobre a Goiânia que não existe mais pode ser encontrado em uma página que vem ganhando força no Instagram. Trata-se do perfil Goiás Tem História (@goiastemhistoria), que já computa mais de 20 mil de seguidores.
A página é gerida pelo jornalista Iuri Godinho, um pesquisador entusiasta do assunto e, já escreveu livros sobre a capital, como “A Construção – Cimento, Ciúme e Caos nos Primeiros Anos de Goiânia, em 2013.
Em seu perfil é possível conhecer e ver fotos sobre a época em que o Chafariz na Praça Universitária havia um importante bar e restaurante, a Avenida Goiás (entre a Rua 3 e a Praça do Bandeirante) era o local mais valorizado da capital e as pessoas iam lá para namorar.
“Quem lembra de quando Mauricinho Hippie andava pelas ruas assoviando com um cachorrinho cor de rosa?”, recorda.
A página, o jornalista conta que nasceu do seu interesse latente pela história. No entanto, quando questionado sobre o que mais sente saudades nos tempos idos, Iuri diz achar a Goiânia de hoje muito melhor. “Melhoramos no trânsito, hoje tem muito mais ônibus e asfalto. Não tinha muito o que fazer, tinha mais bares. Hoje temos muito mais opções culturais e de laser”, diz.
“O símbolo de uma geração inteira segue abandonado”

A afirmação é da arquiteta Marília Mota Rezende, em relação ao Jóquei Clube. Ela é mestre em Arquitetura e Urbanismo pela UFG. Suas pesquisas tiveram enfoque na ética aplicada na preservação do Patrimônio Histórico e Cultural e no Patrimônio da Praça Cívica em Goiânia. Em entrevista ao DM, fala sobre o abandono de outras edificações importantes, a exemplo do prédio do Museu Zoroastro Artiaga.
DM – Quais são as construções e monumentos de Goiânia que percebe estar em situação de abandono atualmente e que foram ou são símbolos da cidade?
Marília Rezende – O Jóquei Clube é um grande exemplo. As disputas sobre o futuro de uma das obras do arquiteto Paulo Mendes da Rocha em Goiânia permanecem. O símbolo de uma geração inteira da cidade não vê andamento no seu processo de tombamento e segue abandonado. Mesmo dentre as edificações tombadas, a situação atual do prédio do Museu Zoroastro Artiaga e do que abrigava originalmente o Tribunal de contas (e que foi sede da Procuradoria Geral do Estado até recentemente, mudança realizada pelas questões estruturais), ambos na Praça Cívica, são preocupantes. As infiltrações, os problemas estruturais e o abandono são questões visíveis – e colocam em risco, inclusive, o acervo do Museu. Existem promessas de intervenção em ambos: mas elas já virão com muito atraso. Mas destaco um local que foi de extrema importância nos anos iniciais da cidade e está quase esquecido, pela população e pelo poder público: A antiga Estação Rodoviária de Goiânia. Localizada próximo ao Lago das Rosas de projeto de Eurico Calixto de Godoy em 1956. Hoje a edificação está ocupada por um batalhão do corpo de Bombeiros, parcialmente descaracterizada com grandes anexos e escondida por muros. O local – de arquitetura moderna e marcante – era o portal de chegada dos muitos imigrantes antes de 1986. Hoje foi engolido pela cidade. Já houve um projeto de restauro aos padrões originais e adaptação de uma alameda gastronômica – mas é só mais um que não saiu do papel.
DM – Quais locais que por algum momento foram esquecidos, mas que foram retomados?
MR – O Coreto, a Estação Rodoviária e o Pórtico do IFG (Antiga Escola Técnica) são exemplos de edificações ou monumentos tombados que ficaram muitos anos abandonados, ou em péssimas condições de manutenção e passaram recentemente (nos últimos cinco anos) por processos de restauro que renovaram sua presença de destaque na cidade. Um respiro contra o esquecimento.
DM- Goiânia é uma cidade que preserva bem suas construções mais antigas?
MR– Não consigo responder que sim. Mal conseguimos preservar aquelas que possuem toda uma legislação protetiva de tombamentos nas três instâncias, como os já citados na Praça Cívica. No âmbito comercial: projetos como o “Cara Limpa” de 2001 não conseguiram viabilidade política para execução, possuindo apenas intervenções pontuais realizadas, e auxiliar na restauração da região central de Goiânia. No âmbito residencial: Um levantamento de 2017, comandado pela Prof. Dra. Eline Caixeta fez um inventário de 339 residências históricas nos setores Central, Sul, Oeste, Aeroporto, Marista, Bueno e Universitário, e mesmo antes da finalização do estudo grande parte dessas construções já estavam descaracterizadas ou foram completamente demolidas, e é grande a probabilidade de nesses cinco anos de lá pra cá, o único registro de que mais da metade dessas construções existiram seja nesse trabalho realizado. Os setores Sul e Jaó tem se destacado na luta por legislações que protejam o setores da verticalização que já atingiu outras áreas da cidade, e que pode passar a ser permitida no novo Plano Diretor com aprovação pendente, verticalização que traz consigo uma quantidade incontável de demolições: como as ainda realizadas semanalmente no Setor Marista.